Os perigos da economia digital | Argumentos para Redação

Invasão de Dados, transações online e muito mais. Descubra o que é economia digital e quais são seus riscos. Confira!

O que é essa tal de digitalização? É um termo que está bastante em alta no mundo e foi impulsionado em diversas áreas durante a pandemia de 2020. A digitalização nada mais é do que a transferências de processos manuais e analógicos para a forma digital – mais rápida e eficiente. A alta velocidade do progresso tecnológico vem acompanhado pela disseminação de novas tecnologias digitais, o crescente papel dos dados e a democratização da internet. A Economia Digital abriu espaço a um processo de transformação digital e de mudança na estrutura econômica. Mas quais seriam os perigos de algo que veio para agregar?

Ao mesmo tempo em que as tecnologias e dispositivos digitais proporcionam facilidade na vida dos indivíduos e vantagens competitivas às empresas, criam incerteza, uma vez que alguns processos, competências e profissões ficam cada vez mais obsoletas. Além disso, no campo sociológico e filosófico o debate sobre a real necessidade de digitalizar processos humanos é bastante discutido, e, por diversas razões, muitos defendem a permanência do contato humano nos serviços.

Dentro do contexto da economia digital brasileira, há muitos desafios que precisam ser enfrentados, dentre eles, a questão da desigualdade digital ainda vigente em uma grande parcela da população, a falta de políticas público-privadas que inclui a participação ativa dos agentes econômicos e sociais, a falta de garantias trabalhistas para os novos modelos de trabalho, e a falta de instrumentos adequados para a mensuração da economia digital nas atividades econômicas. 1

Para você destrinchar em coerência e em argumentação na redação, precisamos entender um pouco mais desse assunto. Então bora nessa quackzinho?!

Covid-19 acelerou a digitalização da economia

Porquinho "cofre" com várias moedas representando a economia.
Imagem de Solen Feyissa, retirada de Unsplash.

A digitalização da economia vem sendo um processo natural desde o advento da Internet na década de 90, mas a crise pandêmica da covid-19 impõe que essa transformação social se dê quase instantaneamente, pois força o trabalho remoto e, obviamente, leva ao consumo digital a partir de casa. As alterações no mercado de trabalho começaram pela necessidade de remanejar colaboradores para o regime de home office e agilizar a infraestrutura necessária em tempo recorde, o que obrigou a sociedade a se reinventar e acelerar a transformação digital. Essa sensação, inclusive, não se restringe aos profissionais da área de tecnologia.

Em entrevista ao programa Roda Viva, Átila Iamarino, doutor em virologia e um dos nomes da divulgação científica sobre o novo coronavírus, também reforçou a sua percepção de que vivemos um momento de grandes transformações em diversos aspectos. “Mudanças que o mundo levaria décadas para passar, que a gente levaria muito tempo para implementar, estamos tendo que implementar no susto, em questão de meses”, constatou. A digitalização deixou de ser opcional.2

A expectativa é que as consequências da pandemia impulsionem negócios e profissões remotas. As plataformas digitais estão cada vez mais empenhadas em garantir contato com o cliente de maneira interativa e prática. Quem ainda não estava acostumado a vender pela internet precisou acelerar seus planos. E com a população toda isolada em casa, não foram apenas as lojas virtuais de itens essenciais (como alimentos ou higiene) que viram um pico nos seus pedidos online. Dados da SocialMiner3 indicam que houve aumento das taxas de conversão também entre as lojas online que comercializam bebidas, itens de beleza, casa e construção.

Com a digitalização, o e-commerce tende a se desenvolver cada vez mais e, junto a ele, tudo aquilo que passamos a chamar de “low touch economy” ou economia sem contato. A “sharing economy” ou economia compartilhada, que ganhou força nos anos seguintes à crise de 2008, ficou para trás. Chamar um taxi ou pedir comida por aplicativo, por exemplo, nunca mais será da mesma forma. […] Um outro excelente exemplo é a utilização do dinheiro. Na época da dinastia Tang (618-907 d.C.), os chineses inventaram o dinheiro em papel, que se consolidou a partir do século X. Mas também foram os chineses que acabaram com as cédulas de papel, ao introduzirem pagamentos por aplicativo, como o WeChat ou Alipay – dois famosos superapps, ou seja, plataformas em que os usuários encontram diferentes serviços como, por exemplo, agendar consulta médica, interagir em rede social, solicitar serviços de mobilidade e até fazer transações financeiras. No Brasil, a prática de pagamento por aplicativo vem, aos poucos, se tornando realidade. Enquanto isso, na China, a tendência já é outra: o pagamento via reconhecimento facial, isto é, o reconhecimento de mais de 30 mil pontos da face humana para o processamento da transação financeira em milésimos de segundo.

Bruno Netto, Edival Lourenço Jr e José Ricardo dos Santos, 2020.4

Pix, startups e fintechs

No final do ano de 2020, um novo sistema de pagamento foi instaurado no Brasil, o Pix, que funciona 24 horas e basicamente transforma toda conta —seja ela corrente, poupança, de pagamento ou uma carteira digital em um grande sistema de pagamentos que concorre com cartões e maquininhas. Porém, também oferece riscos à segurança que vão desde golpes virtuais a assaltos e sequestros-relâmpago – por isso é necessário uma equiparação da desigualdade e da alfabetização digital.

De acordo com a Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), mais de um terço dos brasileiros ainda não usou o Pix, e, dentre os motivos estão a segurança de dados e a desconfiança em instituições financeiras: 62% se sentem pouco ou nada seguros em relação à proteção dos seus dados pessoais na internet e 33% dos brasileiros não confiam nas instituições financeiras, como bancos (33%) e fintechs (37%).5

Segundo o presidente da Cielo, Paulo Caffarelli, a adoção dos meios digitais de pagamentos requer uma mudança na cultura dos brasileiros, situação que só viria com o tempo.

O mundo todo passa por essa transformação digital, mas ela não é homogênea. No Brasil existem vários estágios da indústria de meios de pagamentos, mas o que mais dita a evolução do setor é a economia informal […] Quanto maior for o seu aperfeiçoamento digital, mais exposto ao risco você fica, todos os dias aparecem novos tipos de fraudes e precisamos pensar em novas soluções. Crescer a área de segurança é uma necessidade constante e o processo de livrar os sistemas de fraudadores e criminosos é uma luta diária.

Paulo Caffarelli, presidente da Cielo, em entrevista à Folha de São Paulo.6

O que são startups e fintechs e por quê elas crescem tanto no mercado de trabalho atual?

O termo startup surgiu no Vale do Silício, famosa região da Califórnia especializada em tecnologia e inovação e designa um grupo de pessoas iniciando uma empresa, uma empresa que possui um modelo de negócios repetível e escalável. Elas são inovadoras e, normalmente, usam a tecnologia e geralmente são compostas por um grupo de pessoas com perfil empreendedor.

Existem diversas startups de sucesso no mercado atual, como Uber, Airbnb e a Apple, etc. Com a maior demanda por digitalização, ocorreu uma aceleração muito grande desse ambiente digital e as startups e fintechs, por serem mais flexíveis e rápidas no ajuste das engrenagens, estão se saindo bem no mercado – uma drástica mudança estrutural das corporações tradicionais.

E as fintechs? São empresas que redesenham a área de serviços financeiros, como os bancos, com processos inteiramente baseados em tecnologia – é a junção das palavras financial (financeiro) e technology (tecnologia). As instituições financeiras tradicionais têm uma ideia clara das leis e órgãos de governo que as regulamentam, esse não é o caso das fintechs. Um dos principais desafios a serem enfrentados é identificar quais agências as governam e distinguir os conjuntos de regulamentos que se aplicam a elas. No Brasil, a área ainda tem uma representatividade pequena, o que aumenta ainda mais os desafios.7

Desigualdade digital no Brasil e profissões obsoletas

Em 1990, o geógrafo Milton Santos, nos estudos sobre a formação social do Brasil introduziu uma nova dimensão para entender a formação do território brasileiro: dividiu as regiões do país em zonas a partir de critérios de acesso ao meio técnico-científico informacional, destacando a marginalização tecnológica em zonas do Norte e do Nordeste. Em consonância com os estudos de Santos, a atualidade reforça a ideia de que a desigualdade digital e a falta de amparo tecnológico – seja por falta de competição empresarial, seja por falta de incentivos federais – desfavorecem a população do Nordeste.8

Além disso, o conceito “cidadania digital”, que é o uso responsável das tecnologias pelos cidadãos, o direito e o dever de saber usar corretamente as inovações tecnológicas que surgem ao nosso redor, não é plenamente garantido, uma vez que nem todos sabem se relacionam com as informações da internet. Ou pior: alguns têm fácil acesso à tecnologia, mas não a usam adequadamente e, por isso, confiam facilmente no que é dito nas plataformas on-line.

De acordo com a pesquisa realizada pela Folha de São Paulo em março de 2021, a desigualdade digital aprofundou efeito do isolamento social no comércio do Nordeste e o menor acesso à internet na região também é um entrave para o comércio local. Em um levantamento do Cetic.br (Centro Regional para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação), que mostra o acesso de domicílios à internet por região, o Nordeste é o lanterninha: 65% das residências têm acesso à rede, contra 75% no Sudeste, 73% no Sul, 72% no Norte e 70% Centro-Oeste. Na relação de usuários que fizeram ao menos um acesso nos últimos três meses, a região também fica para trás. Essa realidade dificulta a digitalização dos negócios e o e-commerce, uma vez que 98% das vendas ainda são realizadas em lojas físicas. 9

Em sua obra 21 lições para o século XXI, o historiador israelense Yuval Harari disserta sobre um dos maiores temores que cercam a digitalização da economia: a obsolescência de empregos. Para ele, é crucial entender que a revolução da inteligência artificial não envolve apenas tornar os computadores mais rápidos e mais inteligentes. Ela se abastece de avanços nas ciências da vida e nas ciências sociais. Quanto mais compreendemos os mecanismos bioquímicos que sustentam as emoções, os desejos e as escolhas humanas, melhores podem se tornar os computadores na análise do comportamento humano, na previsão de decisões humanas, e na substituição de motoristas, profissionais de finanças e advogados humanos. Dessa forma, a substituição total de habilidades exclusivamente humanas pode estar bem próxima.

A ameaça de perda de emprego não resulta apenas da ascensão da tecnologia da informação, mas da sua confluência com a biotecnologia. A inteligência artificial não só está em posição de hackear humanos e superá-los, o que torna a diferença entre a IA e um trabalhador humano é uma questão qualitativa e não apenas quantitativa. Duas habilidades não humanas especialmente importantes da IA importantes são a conectividade e a capacidade de atualização. […] Mas por outro lado, se um médico humano fizer um diagnóstico errado, ele não vai matar todos os pacientes do mundo e não vai bloquear o desenvolvimento de todos os novos medicamentos. Em contraste, se todos os médicos são na verdade um único sistema, e se esse sistema comete um erro, os resultados podem ser catastróficos.

Yuval Harari em 21 lições para o século XXI, capítulo 2, intitulado ”Trabalho – quando você crescer, talvez não tenha um emprego.”

A compressão do espaço e do tempo e a desumanização nos serviços digitais

Homem no meio de um relógio gigante mexendo com um computador.
Imagem de Solen Feyissa, retirada de Unsplash.

A compressão do tempo e do espaço tal como enunciada por Marx (1982), e reafirmada por Harvey (1989), indica uma aceleração da cadência do trabalho possibilitada pela criação de instrumentos que guardam, entre outras, a função de associar disciplina, agilidade e controlo dos trabalhadores. A experiência de sensações tais como a de aceleração do tempo ou de eliminação do espaço vulgarizou-se na vida moderna cada vez mais organizada segundo o ritmo do “tempo real”, instituído pelos média digitais. Atualmente, já abordam-se noções como as de desterritorialização e destemporalização que permitem compreender o surgimento de um espaço de dados fragmentado e intemporal, correspondendo a uma “nova geografia”, na qual já não é possível estabelecer uma fronteira clara entre o mundo físico e o digital. 10

Nesse mundo mais rápido onde se escuta, se olha e se toca menos as pessoas se distanciam e passam a ser solitárias no meio de uma grande comunidade tecnológica. A ciência e a tecnologia são as “novas religiões” que vieram para melhorar a qualidade de vida dos seres humanos criando
condições que jamais haviam sido visto na história da humanidade. Apesar de a pandemia ter acelerado o processo de automação do trabalho, também revelou a necessidade do contato humano para garantir o funcionamento pleno da sociedade. Para Alexandre de Souza, professor de Economia da USP, a pandemia mostrou que não é possível viver numa sociedade totalmente digitalizada: “Muitos que achavam que a sociedade poderia ser totalmente digitalizada estão vendo que não é bem assim. Nós temos necessidade de contato humano. Agora, acelerou uma tendência que já vinha acontecendo”. 11

Repertório Sociocultural

  • Conceitos: Sociedade do Cansaço do sociólogo Byung-Chul Han; Alusão ao pensamento de Zygmund Bauman quanto à relação homem-trabalho-tecnologia na sociedade líquido-moderna.
  • Séries documentais: “Better than Us” e “La Carrera Especial”, tratam da inteligência artificial bastante presente no cotidiano humano e, principalmente, em ambientes empresariais;
  • Menção à substituição de empregados e de grandes empresas por simples aplicativos: iFood, AirBnB; Revoluções industriais, principalmente a última, a conhecida Revolução 4.0;
  • Link em que é possível saber se o seu emprego estará a salvo ou será tomado por robôs em futuro próximo: (em inglês) aqui;
  • Obras Literárias: Uberização: a nova onda do trabalho precarizado – Tom Slee; 21 lições para o século 21 – Yuval Harari; Homo Deus – Yuval Harari;

Possíveis propostas de intervenção

  • Maior discussão pública sobre as novas formas de trabalho;
  • Iniciativas das Secretarias Municipais e Estaduais de Educação para disponibilizar, renovar ou adequar as infraestruturas tecnológicas das escolas;
  • Maior discussão do currículo dos ensinos básico e superior para aproximação das exigências atuais do mercado de trabalho – possibilidade de encorajar e de disponibilizar, por meio do Estado, cursos técnicos;
  • Grade curricular do ensino básico com aulas sobre informação e digitalização econômica;

Citações para redação sobre economia digital

Os humanos correm o risco de perder seu valor econômico porque a inteligência está se desvinculando da consciência.

Yuval Noah Harari, historiador israelense, escrito em 2018. | Frase original: “Humans are in danger of losing their economic value because intelligence is decoupling from consciousness”. 12

Meu maior medo é que essa tendência (digitalização da economia) continue, e que o transporte “público” seja substituído por Uber e que qualquer chance de controle democrático sobre esses serviços desapareça.

Tom Slee, escritor, escrito em 2017, | Frase original: “Mammals solve most problems by feeling things. Computers, however, solve problems in a very different way”. 13

Fontes e referências

  1. UNCTAD, 2019 por Alírio Aguilar.
  2. Site e Blog Medium
  3. SocialMiner
  4. Bruno Netto, Edival Lourenço Jr. e José Ricardo dos Santos para o edital Migalhas.
  5. Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), 2021.
  6. Verificado através de matéria na Folha de São Paulo.
  7. Blog Idwall
  8. SANTOS, Milton. Técnica, espaço e tempo: Globalização e meio técnico-científico informacional.
  9. Folha de São Paulo, desigualdade digital
  10. Artigo compressão do espaço e tempo
  11. Jornal da Usp
  12. Verificado através do site WikiQuote. Aparece no livro ”Homo Deus: A Brief History of Tomorrow”.
  13. Aparece no livro ”Uberização: a nova onda de trabalho precarizado”.