É fato que as cidades tendem a se formar próximas a rios e lagos[1]. Segundo Baptista(2013), “Paris, construída em ilhas e às margens do Sena, dele obtinha seu sustento e dele fazia sua primeira “muralha”. Toda a sua história e desenvolvimento teve como fio condutor o rio, a própria essência da cidade: sua posição, controlando o fluxo de mercadorias no sentido leste-oeste, por via fluvial, e possibilitando a fácil transposição na ligação norte-sul da Europa explica, em grande parte, o papel histórico que a cidade desempenhou“[1]. O autor também cita as necessidades de consumo, higiene e irrigação providas pelas águas de um rio, tornando evidente a sua necessidade.
A água potável é a necessidade mais presente na vida das pessoas, e nem percebemos. Nossos corpos aguentam até um mês sem alimento, mas apenas três dias sem água. Além disso, a ingestão de água não potável é considerada um risco à saúde por provocar diversas doenças, entre elas:
- Hepatite[2]: as hepatites são causadas por um tipo de vírus que ataca o fígado, e podem ser causadas pela ingestão de água contaminada, relações sexuais sem preservativo, contato com sangue ou fluidos contaminados, entre outros;
- Amebíase[3]: grupo de doenças conhecidas como disenteria ou disenteria amebiana, são provocadas por um tipo de ameba. São transmitidos com a ingestão de alimentos ou água contaminados com fezes contendo esse tipo de ameba, e podem causar diarréia com pus e sangue nas fezes e abcessos em diversos órgãos. Ainda existe uma variação dessa patologia causada pela “ameba comedora de cérebro”, que é fatal em mais de 90% dos casos[8];
- Giardíase[4 e 5]: patologia causada pela ingestão de água ou alimentos contaminados por um determinado parasita ou pelo contato sexual com contaminados. Causa dor abdominal, diarréia, febre, náuzeas, tontura, fraqueza e perda de peso;
- Cólera[6 e 7]: doença provocada por bactéria presente em água e alimentos contaminados, provoca diarréia intensa e graves crises de vômito, podendo levar a uma grave desidratação;
- Leptospirose[9 e 10]: provocado por bactéria existente comumente na urina do rato (ou de qualquer infectado pela doença), causa fortes dores pelo corpo (principalmente nas panturrilhas), dores de cabeça, falta de apetite, náuseas, vômitos, febre, aumento no fígado e/ou baço, fotossensibilidade, dor ocular, tosse, cor amarelada pelo corpo e olhos, falência renal, falência hepática e pode vir a causar hemorragias pulmonares e cutâneas, problemas em todo o sistema nervoso central, alucinações (geralmente causadas pela febre), entre outros. Altamente perigosa, pode causar a morte em períodos curtos (se não tratada), variando entre uma ou duas semanas. Das doenças apresentadas no tópico sobre água contaminada, é uma das mais graves, e seus sintomas podem ser confundidos com a dengue, malária, doença de Chagas, hantavirose, febre amarela, pneumonia, meningite e diversas outras doenças, o que dificulta o tratamento. A enfermidade, como dito anteriormente, é provocada por uma bactéria transmitida pela urina do rato ou de outros animais infectados, muitos deles de forma assintomática, e penetra na pele através de mucosas (olhos, nariz, boca) e eventuais ferimentos. Seu tratamento consiste na internação do paciente e aplicação de dois antibióticos diferentes, mas pode chegar a seis se a doença for descoberta de forma tardia, e alimentação leve e controlada (para diminuir danos ao fígado e rins do enfermo);
Mas como podemos evitar a degradação de uma das nossas mais valiosas posses? Antes temos que compreender a diferença entre os diferentes tipos de água.
Águas cinzas e águas negras
Caracterizamos as águas descartadas em ambiente doméstico conforme sua origem, sendo que as águas cinzas[11] são toda a água de origem não industrial e que não tenha passado por um vaso sanitário. Isso engloba a água da torneira, do banho, da máquina de lavar, entre outros. As águas negras[11] são as águas que possuem restos de fezes e/ou urina, como as águas de banheiros e mictórios.
Cada um dos dois possui peculiaridades em seu tratamento, e o não tratamento ou tratamento ineficaz pode provocar poluição biológica[15] da água. Por exemplo, embora as águas cinzas não sejam consideradas águas potáveis e nem possam ser jogadas diretamente em rios e afluentes, elas podem, em sua maioria, ser utilizadas para lavar calçadas. Ou mesmo serem reaproveitadas em descargas domésticas, poupando milhares de litros de água todos os anos. O problema na hora da reutilização desse tipo de água é a legislação[12]: por não ter legislação específica para tal, ou, em alguns casos a legislação ser vaga, projetos onde o reaproveitamento seria viável economicamente acabam deixando de lado o reaproveitamento de milhares de litros de água.
Para o tratamento de águas negras, não temos alternativa ainda a não ser o uso de fossas e do tratamentode esgoto convencional. A chamada “fossa” é, em sua essência[13], um recipiente enterrado onde deixamos resíduos orgânicos apodrecerem e se liquefazerem, infiltrando o chorume, já processado, no solo, onde a terra realiza o processo final de filtragem. Existem formas de reduzir ainda mais o impacto provocado pela fossa, como utilizando fossas duplas, com filtros ou outros artifícios para reduzir a toxicidade do resíduo, ou plantando próximo a ela vegetais que sejam capazes de processar esse chorume[14], como bananeiras.
Outras formas de poluição da água
Sedimentar
São partículas insolúveis em água[15], como plástico, mercúrio, pedras, partículas de terra lavadas pela erosão, ou, em casos raros, compostos nucleares [16, 17 e 18]. Na maior parte dos casos, pode ser combatido com o descarte correto do lixo e cobrança do tratamento correto de resíduos de empresas, mas quando o dano está feito, em alguns casos, gera danos permanentes e irreversíveis, como o lago radioativo anteriormente citado[16, 17 e 18] e a contaminação de milhares de animais na Amazônia por mercúrio[19], decorrentes de atividades extrativistas. As águas negras e as fezes de porcos em chiqueiros se encontram nessa categoria.
Esses compostos geram efeitos diversos, como a contaminação da água por diversos tipos de parasitas, a contaminação das pessoas por metais pesados ou compostos químicos, alguns tipos de câncer, enchentes (com o entupimento de bueiros e bocas de lobo), e, por fim, atraem pragas, como ratos e baratas, que podem transmitir outros tipos de doenças.
Poluição térmica
A poluição térmica é, em sua essência, o aquecimento[15] de um fator do ecossistema, nesse caso, a água. A mudança na temperatura da água pode gerar grandes danos ao meio ambiente, matando formas de vida mais frágeis[15], causando proliferação ou morte de algas e protozoários[21] e até mesmo destruindo o equilíbrio do ecossistema como um todo. As usinas térmicas, incluindo as usinas a carvão, gás natural, e as termonucleares, precisam de um suprimento constante de água doce para refrigeração de suas partes[20], água essa que, ao retornar ao rio ou lago, pode ter um aumento de temperatura de diversos graus.
Para redução dos danos, é necessário desenvolver mecanismos para dissipar esse calor antes de voltar para o rio ou lago, assim como incentivar o uso de fontes de energia que não usem a água dos rios e afluentes para a refrigeração, como energia solar e energia eólica.
Poluição química
Se a água possui substâncias venenosas diluídas[15], chamamos esse tipo de poluição de poluição química. Esse é o tipo de poluição que mais afeta os seres humanos, contaminando-nos com restos de remédios e hormônios[22 e 23], pesticidas[24]e outras substâncias potencialmente perigosas, além de e contaminando também o meio ambiente com essas substâncias.
Para muitas dessas substâncias, não existe um método de purificação eficaz para a água contaminada, o que agrava a situação.
O que podemos fazer?
Como foi referido anteriormente, como muitos desses contaminantes são difíceis de serem removidos da água, o ideal é que eles nem sejam despejados nela. A cobrança de legislação mais rígida para empresas poluentes é um requisito para não agravarmos ainda mais a situação, assim como para impedir tragédias como a de Brumadinho (e para punir os responsáveis). Também é essencial uma reeducação da população, com a explicação dos potenciais danos do descarte incorreto de dejetos, incluindo águas negras, pilhas, metais pesados, entre outros.
Também é de grande importância o incentivo para a criação de novas técnicas de filtragem e purificação de águas, assim como investir na limpeza de rios e afluentes. É importante também investir, como cidadão, no tratamento de água de sua própria residência, realizando a manutenção periódica de seu sistema de esgoto, instalando fossas mais modernas e instalando recursos para o reaproveitamento de águas cinzas.
Referências
[1]: UFMG – BAPTISTA, Márcio; CARDOSO, Adriana. Rios e cidades: uma longa e sinuosa história…
[2]: Ministério da Saúde – Hepatite
[3]: SBI – Amebíase
[4]: Dráuzio Varella – Giardíase
[5]: Secretaria da Saúde de Goiás – Giardíase
[6]: Dráuzio Varella – Cólera
[7]: Ministério da Saúde – Cólera
[8]: G1 – Ameba ‘comedora de cérebro’: caso de infecção na Flórida gera alerta nos EUA
[9]: Ministério da Saúde – Leptospirose
[10]: UFRJ – Cives – Centro de Informação em Saúde para Viajantes – Leptospirose
[11]: Pensamento Verde – Qual é a diferença entre água cinza e água negra?
[12]: eCycle – As cores dos efluentes: entenda as diferenças entre água cinza e água negra
[13]: Esgotecnica – Saiba como funciona a construção de fossas
[14]: Portal Tratamento de Água – Tratamento de água negra domiciliar através de bananeiras por tanque de evapotranspiração
[15]: eCycle – Poluição da água: tipos, causas e consequências
[16]: Russia Beyond – Lago Karachai, na Rússia, é mais perigoso que Chernobyl
[17]: CanalTech – Lago tóxico na Rússia vira ponto turístico para influenciadores no Instagram
[18]: R7 – Influencers acham lago perfeito para fotos, mas era depósito tóxico
[19]: Exame – Amazônia: garimpo pode ter contribuído para contaminar botos com mercúrio
[20]: Portal São Francisco – Poluição Térmica
[21]: Superinteressante – O que é maré vermelha?
[22]: O Eco – Medicamentos e Meio ambiente: soluções individuais, problemas coletivos
[23]: eCycle – Os remédios que você toma podem estar contaminando peixes
[24]: Embrapa – Pesticidas e seus impactos no ambiente